13 março 2017

teste


Haveria então essa casa imaginada por ela e invisível para os outros. O cheiro de café sendo coado viria da cozinha e logo abraçaria todos os outros cômodos, do térreo ao segundo andar, e se você pudesse ficar em silêncio sentada no fim da escada de madeira, ouviria a avó materna assobiar a mesma música do Roberto Carlos de todas as manhãs tocada no radinho, enquanto estalava as pontas dos chinelos de borracha contra o piso de tacos, e algumas panelas bateriam umas nas outras para que buscasse a frigideira e completasse a feitura do café da manhã, e saberia que, se pudesse continuar a ouvir os sons da cozinha e levantar do degrau e andar até a janela da sala, abriria as cortinas finas decoradas por rendas, para revelar a rua recém-asfaltada, e um Fusca barulhento tentaria dar partida em algum lugar lá fora, um velho barrigudo sem camisa em uma bicicleta atravessaria a composição da vista entre a sua casa e as casas de muros baixos brancos, rosas e amarelos do outro lado da rua, e, antes do retorno, eles mais uma vez surgiriam, vindos das esquinas, caminhando com lentidão até o portão, atravessando o quintal, abrindo a porta e entrando, todos, todos esses familiares invasores, passo a passo, que, a esse estágio da fuga, seriam a única coisa indestrutível.

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